sábado, 1 de dezembro de 2012

50 tons de repressão sexual

Eu pensei que jamais voltaria a escrever neste blog, por uma série de motivos, que talvez um dia eu paute. No entanto, a revolta com o assunto do momento me fez retornar. É claro que eu poderia estar escrevendo em qualquer um dos meus outros espaços (para mais sobre meu trabalho, leiam http://apalavrista.blogspot.com.br/). Mas é essencial que este post seja lido, portanto, nada melhor do que ele estar entre outros do mesmo elemento: sexo.



E o assunto é esse mesmo, o tão falado 50 tons de cinza. Eu não li o livro, não pretendo ler, e vou escrever sem ter lido. Minha discussão, afinal, não é sobre o livro e sim sobre a leitura do livro e sua repercussão.

Primeiro: parem de crucificar as mulheres que estão lendo o livro. Por favor! Sabemos sim que o livro possui diversos pontos, questionáveis. Não vou entrar em cada um deles porque vocês devem ter lido isso aos montes por aí, mas falar mal do livro é muito diferente de falar mal de quem lê o livro. Este livro está sendo um grito, um grito de liberdade para muitas mulheres. É fácil pra mim, pra muitos de vocês, falar que o livro é ruim. Eu leio "literatura erótica" (e putaria escrachada) desde o início da minha adolescência. Este assunto não é novidade, nunca me foi negado e absolutamente me interessa. A questão é que sou uma entre milhares. Para a maioria das mulheres, ler sobre sexo sempre foi um enorme tabu, quase impossível de ser transposto. Neste aspecto o livro é sim uma enorme quebra de paradigmas.



Segundo: "Mas como assim elas estão gozando com essa babaquice?" Gente, elas ESTÃO GOZANDO! Por favor! ELAS ESTÃO GOZANDO! Ouviram bem? Imagine que merda de vida sexual uma parcela enorme das mulheres tem para estarem sentindo prazer com uma história dessas. Desculpem os que curtem culpabilizar o indivíduo, mas isso é um sinal cabal de que a vida sexual das mulheres é uma merda. E isso, meus caros, é culpa de uma sociedade que nega o prazer a todos, mas principalmente às mulheres. Eu estou mais do que acostumada a confrontar esta realidade, quando vejo que, mesmo longe do ritmo que eu gostaria, minha vida sexual foi e é mais rica e diversa do que a soma da vida sexual das mulheres que eu convivo, independentemente da idade.



Terceiro: Está tudo errado, mas ainda assim é sobre transgressão e fetiche. Gente, ok, eu conheço muito bem o mundo do BDSM, sei que praticamente tudo no livro é completamente condenável e que nossos amigos bdsmistas estão "em polvo rosa". Eu super concordo com tudo isso. Ainda assim, quando antes na história deste mundo ouviu-se falar tanto em fetiches? Há quem diga que é melhor não saber que existe, do que ter uma concepção errado do BDSM. Eu acho que não. Simplesmente porque sabendo que existe, 5 minutos procurando na internet a pessoa já vai ver que não é bem por aí e vai se abrir pra viver coisas muito gostosas. Sério, gente, muito sério: a maioria das pessoas nunca faz nada de diferente na cama. Triste, muito muito muito triste, mas absolutamente real. Tem mulher que quando faz ou recebe sexo oral é o acontecimento do século, tipo, uma vez por ano e olhe lá. Essa é a realidade da cama da maioria das pessoas.

Quarto: É machista pra caralho sim, mas não venham culpar o BDSM. Ok, vocês sabem que eu sou feminista, disse isso desde o primeiro post. É óbvio e evidente que o livro é de um machismo absurdo, principalmente por tentar mostrar que uma mulher faz qualquer coisa por dinheiro, inclusive entrar num relacionamento abusivo. Mas só não venham dizer que é machista por conta do BDSM. Sei que é um pouco difícil essa compreensão por algumas vertentes do feminismo, mas o jogo de dominação e submissão do BDSM não é anti-feminista. Eu mesma, que sempre me disse dominadora (o que era bem coerente com minha postura feminista e tudo mais), hoje em dia assumo que gosto sim de ser dominada. É um contexto sexual. É fetiche. É explorar diferentes sensações e prazeres com alguém. Gente, falou de novas possibilidades de prazeres, desde que envolvam adultos que estejam de acordo, cai dentro! Se alguém utiliza de uma desculpa BDSM para impor coisas que você não quer este alguém é babaca, indiferentemente de qual sua filosofia sexual. E babaca tem em todo lugar e temos que ficar espertas SEMPRE.



Quinto: Não gostou? Que tal fazermos melhor? Eu também não gostei, mas acho que também cabe a nos escritores e ao público desenvolver literatura erótica de qualidade, coisa que não vemos muito mais por aí. Claro, podemos citar diversos grandes escritores na história. Eu amo Marques de Sade, amo Anaïs Nin e uma ou outra coisa que não me lembro bem agora. Tem coisa boa erótica sendo escrita? Estou perguntando sinceramente, porque eu não conheço nada. E, mesmo eu, escrevo uma literatura erótica de qualidade mas não divulgo, então, no que estamos contribuindo pra mudar isso?



Enfim, meus caríssimos, pensemos sobre tudo isso. E, a cima de tudo, muito cuidado para não transformar seu discurso que deveria ser politizado em um discurso de opressão, não culpem os leitores, é o mesmo erro que cometemos a culpar os eleitores, a culparmos as vítimas, ao culparmos todas as vítimas, em diferentes esferas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário